Queremos dar boas notícias aos amigos
Bons amigos são raros. Aqueles que perguntam das novidades e nos olham atentos e curiosos pela resposta são ouro. E assim sou com os que gosto muito. Mando mensagem para saber sobre as novidades, sem mais nem menos.
Com os que eu me importo quero estar presente. Se me contam algo bom ou ruim não importa. O jeito que contam é bom por si só. A pessoa por trás do fato é quem importa de verdade e o martírio dela é tão passível de interesse quanto a alegria.
Seus problemas são complexos, os dilemas e fugas também. Aqueles dos quais admiro e considero meus amigos tem o poder de abrir um triplex em minha cabeça. Me fazem refletir, mudar de ponto de vista…
Durante a conversa eu posso até não dizer “Nossa, tem razão!”, mas depois me pego pensando “Não é que aquele porra tá certo ?!”, “Aff, essa menina é fogo, vou ficar a semana inteiro encafifado com isso…”.
Quando algo nos deixa animado, dizemos a eles “É amanhã” e quando são bons amigos, respondem algo como “Tô na torcida, depois me conta se rolou”.
É difícil esperar um acontecimento se tornar real pra poder contar. Antes de acontecer a gente dá previa aos nossos. Como esperar? Não dá! A expectativa de uma conquista nos faz tão feliz quanto ela em si.
Só que essa expectativa que nós criamos e repassamos aos amigos pode ser frustrada. O motivo da animação pode virar motivo de tristeza. Nossa e deles.
“E aí, como foi lá?” (Nem foi)“Deu certo né? (Deu muito errado). “Conta tudo!” (Tudo? Será que conto toda a tragédia?). Eles querem atualizações. Merecem. Só que as vezes ocorrem desastres com a gente. Grandes desastres! E contá-los é quase tão doloroso quanto o motivo da nossa dor.
Aquele ocorrido doeu em mim. Sempre que meus amigos perguntavam sobre o desfecho era difícil contar. E toda vez que eu contava a dor ficava mais real, aumentava de tamanho.
As vezes eu pensava “Tá vendo? Boca aberta! Se tivesse guardado pra você, não precisaria explicar agora e reviver a dor”.
(Esse pensamento é errado. Se eu não contasse pra ninguém, sofreria mais ainda. Sofreria sozinho e nem receberia empatia. Querer receber empatia não é sobre ser o centro do universo, sobre precisar de atenção... É sobre ser acolhido por quem a gente gosta nos momentos difíceis. A gente acolhe e também precisa de acolhimento).
Esse texto é sobre uma situação específica. Eu queria muito poder contar para os meus amigos que deu certo. Queria não ter que ver a expressão deles mudar ao contar o que aconteceu, de felicidade para surpresa-tristeza-dó. Queria deixá-los felizes, assim como eles me deixam. Queria vê-los orgulhosos. Queria ser exemplo pra eles.
Não foi possível. Me perguntaram se deu certo, e eu disse que não. Expliquei a razão, brevemente, mas sem deixar as partes importantes passarem. Não queria receber mais perguntas e ter que respondê-las uma a uma. Ao mesmo tempo, não poderia deixá-los sem resposta.
Por isso, elaborei um roteiro. Me perguntavam do ocorrido e eu contava tudo em um minuto. Texto inteiro decorado. Nada crucial era deixado de fora, nada desnecessário era mantido. Se contar me faz sofrer, conto rápido.
Após a explicação, seguia minha vida. Já foi. Ouvia brevemente suas frases empáticas, permitia que sofressem a dor dos amigos, mas não dava margem para perguntas.
Sou assim. O pragmatismo é minha especialidade. Minha defesa. Na perda eu vivo as cinco fases do luto sem tentar acelerar nem desacelerar etapa alguma. Enquanto vivo-as, faço anotações, racionalizo e absorvo o impacto.
Luto é perda. Tem cinco fases. Aquilo que se foi não está ao meu alcance. Logo, deixo no passado. O objeto do meu luto tem presença constante em meus pensamentos enquanto reflito sobre ele. E dou o nome de objeto porque após o fim do luto é assim que existe para mim.
Toda emoção ligada a ele foi deixada na quarta fase, depressão. A mais intensa das etapas. Na quinta eu quero aprender o que der, voltar ao lugar comum e seguir minha vida.
É justamente isso que faz eu superar perdas mais rápido, mas não de forma menos sofrida. Sofrimento não mede-se com tempo. Muitos lutos rapidamente superados ainda são muitos lutos. Alguns geram traumas, não importa o quão rápido eu assimile-os. Superar não é apagar. Não dá pra excluir vivências da timeline não-virtual.
Só que uma das partes mais difíceis do processo é contar aos amigos as más notícias. E eu, caro leitor, confesso que estou muito cansado de dar notícias tristes a eles.
Estou extremamente cansado de escrever textos como esse, sem coesão, com o mesmo padrão: 1- Início esperançoso; 2- Tecnicidade desnecessária; 3- Desfecho triste, 4- Sem moral da história.
Sempre o mesmo plot-twist: finais tristes que sucedem títulos e introduções felizes. Parecido com as más notícias que tive que dar aos meus amigos recentemente…